sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Verdade e divergência: sobre um certo mal-estar nos helenismos

Escrevo esse texto muito motivado por uma questão levantada pelo Odir Fontoura ao questionar, de maneira curiosa, como diferentes grupos interpretam o símbolo da tocha olímpica contemporânea e a tentativa de algumas pessoas de apagá-la. Sendo assim, aproveito esse texto para dois propósitos, a primeira oferecer minha posição enquanto membro de um grupo de pessoas devotadas ao Hellenismos e que é, em sua maior parte, fortemente influenciadas por uma abordagem reconstrucionista sobre a religião. Meu segundo propósito é esboçar uma ideia que venho tentando construir de maneira reflexiva com vistas a entender os diferentes sentidos que grupos atribuem à sua prática devocional (pessoal, coletiva ou institucional) vinculada aos deuses e deusas "também" cultuados pela civilização helênica. 

Ao dizer que minha perspectiva é uma perspectiva reconstrucionista gostaria de deixar claro que, longe da posição enviesada e pouco crível, reconstrucionismo não diz respeito a uma hipervalorização dos fundamentos teóricos, ou do estudo de uma religião em detrimento da prática. Isso não só é reducionista como ignora que toda experiência religiosa é uma experiência de estudo e aprendizado contínuas, e que o estudo é uma atividade tão “prática” (retomando a acepção etimológica da ideia de práxis), quanto a prática é uma modalidade de estudo. Enfim, ambas constituem a experiência religiosa como um espaço de reflexão e compreensão da relação com o sagrado e com os espaços da interioridade e da exterioridade através dos quais ecoa o ser de cada grupo ou sujeito.

Reconstrucionismo é uma perspectiva sobre a experiência religiosa que busca ancorar o exercício devocional cotidiano em bases que sejam tão próximas quanto aquilo que é possível saber sobre como os ritos eram compreendidos e executados, e a partir daí estabelecer possibilidades adaptativas condizentes com o plano geral desses sistemas de crença. O reconstrucionismo não é assim uma perspectiva homogênea e estática, ao contrário, é múltipla, plural e dinâmica. É uma forma pragmática de exegese, uma contínua provocação que pode ser (ainda que precariamente) sintetizada em questões como: em que medida é possível compreender como um determinado povo em um determinado lugar executava e entendia sua relação com o sagrado e com o divino? Como é possível traduzir a partir de uma escala de diferença temporal práticas que, mesmo quando transportadas para uma outra arena material e geográfica, buscam evidenciar um princípio de continuidade? 

Considerar os efeitos do tempo é uma forma de amadurecer e reconhecer as práticas que produzimos como práticas implicadas e situacionais. É recusar a autoridade barata e fácil que o tempo, quando tomado enquanto quantificador, ilusoriamente induz. De modo mais exato: não se trata de há quantos anos você está vivenciando determinada relação com os deuses e outras categorias de seres do panteão, mas sim a qualidade dessa relação a partir dos critérios que são estabelecidos. 

Entendo dessa maneira que, longe de um exercício arbitrário e violento de autoridade, o reconstrucionismo se diferencia de outras abordagens sobre a religião na medida em que reconhece os limites e as circunstâncias impostas pelo deslocamento temporal. Recorrer ao passado, às fontes e aos registros, não é, de modo algum, uma fuga. É uma forma de responsabilização pelo tipo de conhecimento que cada experiência produz. É uma forma reconhecer e dialogar com as divergências que são constitutivas e positivas da experiência com o sagrado conforme os grupos vivem e percebem-na cotidianamente. Já na antiguidade clássica as práticas eram plurais, de modo que é absolutamente equivocado falar em ortodoxia no contexto da religiosidade helênica. Contemporaneamente, por outro lado, acredito que exista algo como uma disputa por significados e por representação dentro da experiência religiosa, e as religiões politeístas não escapam desse movimento. Como efeito imediato, isso produz (ou visibiliza) a tentativa de construir regimes de autoridade que podem ser violentos na medida em que a divergência e a diferença tendem a ser tomadas como danosas. Mais que isso, em certas interações e debates que acompanho nas redes sociais, parece construir-se uma imagem na qual a diferença, mais que perigosa, é danosa e deve ser extirpada. 

Como responsável por tantos processos de formação da comunidade religiosa dentro do grupo do qual faço parte, o RHB, minha perspectiva é diametralmente oposta a essa visão. Entendo que há um valor intrínseco e potente na possibilidade como cada pessoa ou grupo vive e compreende a religião. Na forma como proponho exercícios às pessoas pelas quais sou responsável na formação, longe de respostas exatas (o que geralmente é reduzido à uma estreita concordância com quem avalia) me interessa mais que as experiências pelas quais essas pessoas passam sejam significativas e coerentes, e que essa coerência seja possível de ser refletida e ancorada com seus próprios quadros referenciais. Isso em suma é muito difícil, e inequivocamente cometemos tropeços. Mas reconhecer-se no erro é também um exercício de gentileza (sophrosýne) e uma possibilidade elaboração e excelência (areté).

As várias formas como o Helenismo é vivido hoje (reconstrucionista; nativista; estilo de vida; filosofia de vida; caminho; possibilidade dentro da bruxaria; panteão; tradição;) e a forma como isso se relaciona também a outras perspectivas ou arcabouços (reconstrucionista, nativista, bruxaria/feitiçaria, ecletismo, tradições familiares, entre outras) é um elemento configurador disso que eu, apropriando-me de um conceito elaborado pela antropóloga Anne-Marie Moll, gostaria de chamar como ‘política ontológica’. 

Ontologia se refere à forma como compreendemos o "ser". Nesses termos, uma política ontológica quer dizer a forma como negociamos e colocamos em debate ideias relativas ao que “é ser”. Mais que isso, ao pensar nas expressões e contextos a partir do qual o Helenismo emerge acredito que, apesar da palavra (ou referente) ser o mesmo, ‘helenismo’, ele “não é” a mesma coisa. O Helenismo da bruxaria tradicional não é o mesmo do helenismo do reconstrucionismo. Da mesma forma, por exemplo, a forma como alguém vinculada a esse primeiro grupo percebe e constrói a imagem de uma deusa tão ambivalente hoje em dia como Hécate, é distinta. Essas formas, não são nem verdadeiras, nem falsas. São distintas. Isso, porém, pode levar a uma simplificação boba do tipo “ninguém está errado, todos estão certos” quando considerados seus pontos de vista, ou o que importa é o que você acredita. Não é isso que quero dizer. Em muitas ocasiões afirmei que esse tipo de resposta muito comum é ingênua porque repete a negação da diferença e da divergência e a reduz a um ponto de vista. E o que é um ponto de vista? É a negação da divergência através da redução a uma experiência (usualmente tipificada como) menor. 

As formas de apropriação do Helenismo são ontologicamente políticas ou politicamente ontológicas porque o modo como cada grupo e pessoas dentro desses grupos constrói os seus referentes é simultaneamente particular e coletiva. É individual na medida em que fala sobre como a experiência fala para cada um, mas é coletiva na medida em que é também referendada dentro de uma comunidade. Não é de se estranhar, contudo, que ao negar a diferença e a divergência, acabemos construindo uma disputa sobre a verdade do helenismo: que tipo de atitude é mais ou menos válida?, o que faz sentido ou não? Que grupo é realmente helênico e quais não são? Supor que há algo que "é" implica também reconhecer que há outras coisas que não são. Isso é política.

No caso do helenismo, a sensação é que estaríamos a (ou deveríamos) falar da mesma coisa. Ora, por um lado estamos, mas por outro não estamos, e é preciso reconhecer e situar os limites de nossas respostas também. A forma como o reconstrucionismo produz essa forma de reconhecimento e delimitação é valendo-se de uma organização tripla, uma equação composta de: experiência-referência-tempo. Em certo sentido, acredito que o tempo é tão caro à prática do reconstrucionismo quanto a sombra é para (o que eu entendo como) prática da bruxaria. 


E a tocha?

Dado isso, voltemos à tocha. Afinal, a tocha olímpica contemporânea é um símbolo sagrado? É uma ofensa apagar o fogo que é nela depositado? Como reconstrucionista helênico entendo que, nesse contexto de comunidade e de pessoa a partir do qual falo, não há nenhum elemento helênico de sacralidade nisso. E para chegar a tal conclusão considero que os aspectos rituais que fazem com que um determinado objeto ou espaço sejam instituídos como sacros, como pios (eusebios) não foram cumpridos. É o mesmo raciocínio que usamos para diferenciar alguém que se coloca como sacerdote quando na verdade ele, se não é líder ou especialista em um determinado campo de experiência do sagrado, ele é no máximo sacerdote dentro de um contexto específico (o grupo/thiasus/coven/demos, enfim).

Não basta dizer que todo fogo gerado é sagrado. Não se trata da coisa, mas da forma como ela é produzida. O fogo é um símbolo do sagrado, mas a tocha olímpica em si, não é um símbolo sagrado. Acredito que, se por um lado o fogo é um símbolo sagrado, dada a dimensão ritual não qual é interpelado como símbolizador da presença dos deuses, ou um canal para eles, a tocha, por outro lado não é um símbolo sagrado. Talvez fosse mais produtivo pensar numa diferença entre símbolos do sagrado e símbolos sagrados. O fogo que queima um churrasco é tão ímpio quanto aquele que queimará as páginas desse texto quando as pessoas que, eventualmente, discordem da minha posição o ler. Uma chama, no escopo da prática e do sistema de crenças-referências a partir do qual minha fala é enunciada, só é sagrada quando devidamente selecionada, feita de maneira zelosa, limpa e piedosa e ofertada a Héstia por alguém que tenha suas mãos e corpo limpos, por alguém que realmente entenda Héstia como uma divindade digna de reverência e não como uma personagem da literatura mundial ou da mitologia (em seu aspecto depreciativo) de um povo. É o ritual que confere sentido às coisas e aos seres, isso é uma lição antropológica herdade desde Frazer, por exemplo. Ritual não implica necessariamente a cerimônia, seja ela qual for, mas o modo como usamos e reiteramos relações entre prática-símbolo-materiais, é um processo de transformação e reconhecimento. Nem todo pão é o corpo de Cristo, no cristianismo, assim como nem todo fogo será a chama de Héstia nos Hellensismos. 

Em todo caso, considerando a forma como os helenos entendiam sua relação com a sua crença e as crenças dos outros, acredito que o exercício deliberado de apagar a chama é, em certa medida, uma violação, uma violência. Não importa que a religião aqui em questão seja o esporte ou o capitalismo global (mode irônico ativado).

É preciso considerar ainda que, no contexto brasileiro a partir do qual essas tentativas de apagamento da tocha vem ganhando vulto e significado, mais que uma disputa por representação e pelo monopólio da verdade, existe uma questão efetivamente política de contexto nacional. Nesse sentido, apagar a tocha é uma forma de manifestação contra movimentos políticos  considerados ilegítimos. Não tem tanto a ver, por parte daqueles empenhados nessa atividade, com uma recusa ou uma discussão sobre os aspectos propriamente religiosos do referente (a tocha). Nesse cenário, mesmo reconhecendo essa tensão entre a insignificância e impiedade do ato, me disporia a tentar apagar a tocha. Sem qualquer constrangimento com a possibilidade do objeto alvo da ação ser um símbolo religioso. 

Reduzir um aspecto simbólico tão complexo à sua forma-aparência é uma atitude ingênua, quando não deliberadamente violenta e arrogante. Se a modernidade reclama a tocha como símbolo da sacralidade dos jogos olímpicos (que são mais globais, que propriamente olímpicos), para um heleno a sacralidade desse rito (o esporte) talvez esteja mais alocada em símbolos como o stephanos (a coroa de louros) e as ânforas com as quais os vencedores das competições eram premiados. O fogo é em si, quando devidamente consagrado, um símbolo mais amplo no nomos archaios, da antiga tradição, e não dos jogos. E convenhamos, a dimensão religiosa tal como compreendida e experimentada pelos helenos, é algo que falta às Olimpíadas da era moderna.

As crenças crescem e se constituem tanto de maneira contrastiva, quando são comparadas e percebidas como distintas umas das outras, quanto de maneira confirmativa, quando reconhecemos a pertinência de certas aproximações e semelhanças. 


Notas
1- Me perdoem se houver aqui um excesso de academicismo, isso também é parte da minha forma situada de produzir conhecimento a partir das experiências que efetivamente vivencio.
2 - Agradeço imensamente a Andrea Vasconcellos (Drea Cellos) pela possibilidade de discutir e produzir alguns insights presentes nesse texto preliminar. 

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Hellenismo, Wicca e Reconstrucionismo

Nos últimos meses uma série de incidentes e discussões na grupo online do RHB (Reconstrucionismo Helênico no Brasil) me fez repensar o quão o Helenismo é uma noção aberta, como já disse em um dos últimos textos aqui no blog. De modo geral, quase qualquer pessoa hoje em dia que estabelece alguma relação com os deuses da Grécia (e vejam que falo deuses da Grécia e não religião helênica) pode tomar para si o adjetivo 'heleno' ou 'helena'. Até aqui tudo bem, afinal de contas, o Helenismo não é um patrimônio de um grupo particular, mas um conjunto de práticas, crenças e valores dos quais qualquer pessoa pode apropriar-se, seja com finalidade religiosa e devocional ou não.

Vamos ilustrar algumas das situações que percebo e nomeio como incidente: uma pessoa chama para si o título de Sacerdote de Poseidon; outra pede ajuda na sua relação pessoal com Thanatos, e mais outra aproveita a deixa para pedir que ajudem a encontrar epítetos relacionados a certas faces de Hades que ele cultua; em um terceiro episódio, durante um debate sobre um livro em especial e as possibilidades dele ser usado em uma abordagem reconstrucionista, de modo um tanto confuso uma moça comenta sobre as razões pelas quais Hécate é representada sempre com uma face sombria, trevosa, ignorando assim outros aspectos que ela assumiria nas condições de donzela, por exemplo. 

Essas situações podem passar desapercebidas e de fato são bem pequenas quando comparadas a questões mais problemáticas, a exemplo das diferenças entre helenos e gregos na Grécia, ou do estatuo público da religião, enfim. Todavia, pra mim elas sinalizam, dentro do contexto brasileiro em especial, para o modo como as religiões estão em contato constante (e isso é ótimo, não vamos perder isso!), mas ao mesmo tempo o quanto de ignorância se alimenta quando se está na casa de um anfitrião e não se respeita as regras de hospitalidade estabelecida por esse anfitrião, isso para usar uma imagem mais próxima do Hellenismos. 

Então, vamos lá. Helenismo e Hellenismos não são a mesma coisa. Helenismo de modo geral é o termo que caracteriza a experiência religiosa vinculada aos povos da Grécia e sues deuses, heróis e daemons; Hellenismos é a forma reconstrucionista de exercer essa religião nos dias de hoje.  Como também já disse, o reconstrucionismo de modo amplo e em suas variadas vertentes é originário de um desconforto por parte de alguns sujeitos - em especial na Europa e nos Estados Unidos - com a falta de profundidade das religiões da Nova Era, e em especial da Wicca, no que tangia à forma como as pessoas se apropriavam de religiões pré-cristãs. 

Ainda que essa justificativa possa ser considera, ela sem dúvida deve ser repensada hoje em dia. Não me parece adequado avaliar uma religião com base nos preceitos de outra, de modo que não podemos avaliar com inadequada ou equivocada a forma como wiccanos em sua diversidade cultuam a uma deusa que tem suas origens na Grécia, por exemplo, Isso porque desde a antiguidade os deuses não são propriedades de um povo, mas eram potências vivas, seres atuantes e que se dispersavam por todo o mundo. A história de Dioniso e Apolo são bastante singulares nesse sentido; e é só através desse passo inicial que podemos considerar a possibilidade de, como brasileiros, aderirmos a uma experiência religiosa que a priori não teria qualquer vínculo com a história do país. 

Contudo, distinções são necessárias, pois são elas que organizam e dão forma aos modos como as pessoas de grupos diferentes significam e expressam sua relação com o sagrado. Sendo assim, retomo aqui algumas das diferenças entre a Wicca e o Hellenismos como forma de pensar o que distingue uma forma reconstrucionista e uma forma wiccana (e aqui me atrevo a por junto tanto tradicionalistas quanto ecléticos) de pensar esse estado no mundo com os imortais. 

1. A Wicca define um deus (masculino) para o sol e uma deusa (feminina) para a Lua. Os Helênicos são menos definitivos quanto ao gênero dos deuses. Há deuses machos e fêmeas para o sol, a lua, e todas as outras coisas.

2. A Wicca é (originalmente) duoteísta. Os Helênicos são politeístas e animistas. A Wicca é duoteísta porque coloca todas as deusas com a cara da Deusa-Mãe-Criadora e todos os deuses com a cara do Deus-Pai-Noivo/Cornífero. Já os Helênicos tem um panteão extenso, que não é tão simples assim. Os deuses helênicos são nossos deuses, os deuses vindos dos gregos. A Wicca os empresta quando o quer, mas não tem um deus identificado como exclusivamente wiccano. (O que eu quero dizer é que a nossa Mãe não é a mesma Mãe wiccana.)

3. A moralidade wiccana é baseada em "não prejudique ninguém", como a filosofia cristã e hindu de não ferir os outros. A moralidade helênica (assim como a nórdica) é baseada primeiro no heroísmo e na honra pessoal. Como foi dito por Diógenes Laércio "Os Deuses devem ser tratados com reverência, nenhum mal deve ser feito, e a honra deve ser preservada". Ou como os celtas costumam dizer: "Verdade em nosso corações, Força em nossos braços, e Realização em nossas línguas", esta última querendo dizer que as palavras de alguém devem refletir seus sentimentos e atitudes, e serem defendidas para manter a honra da pessoa. 

4. A Wicca tem um conceito limitado dos "Outros Mundos". Os Helênicos acreditam que a interatividade entre esses "Outros Mundos" e o nosso é, muitas vezes, a base central de nossa prática.

5. A Wicca é uma religião invocativa e que leva ao êxtase. Os Helênicos acham que esse é um aspecto secundário da cerimônia. 

6. A Wicca cria espaços sagrados, que chamam de "abrir o círculo". Os Helênicos vêem os espaços sagrados como algo 'onipresente', ou seja, que está em todos os lugares (mesmo que ele possa ser reconhecido e delimitado para intenções devocionárias ou para uma cerimônia).

7. A Wicca é uma religião iniciática. Os Helênicos têm elementos iniciáticos (os rituais de passagem, que estão conosco no curso de nossas vidas, sendo uma parte da vida, celebrando a vida). Isso se dá porque ainda que houvessem ritos de mistérios que incluíssem um elemento iniciático, a base do Hellenismos é a religião civil e pública e sua interface com o mundo doméstico.


8. A Wicca usa os elementos clássicos, mostrados pela cultura greco-romana (terra, fogo, água, ar, e talvez o Éter ou Akasha). Os Helênicos não têm nada tão material assim. Nós temos o céu (Urano), a terra (Géia), a noite (Nyx), o caos (Khaos), ... etc.

9. Alguns wiccanos dançam nus no ritual, já no helenismo era proibida a nudez no templo ou outros locais sagrados. Apesar de alguns festivais terem nudez, ela acontecia em um local apropriado para isso, e com um propósito, normalmente a fim de re-encenar algum mito que assim o solicitava em honra de sua origem. Outra coisa quanto a vestimentas: os romanos, por exemplo, usavam capuz no templo, os gregos não. E os wiccanos fazem como querem.

10. A Wicca não dá ênfase à mitologia (adota-se a possibilidade de uma reunião  devocional - com elementos celtas, nórdicos, helênicos, romanos, hindus, egípcios, xamânicos, etc). Na tradição helênica, a mitologia é central e para toda a vida; ela faz parte da prática, dos rituais e dos ensinamentos. A visão helênica dos deuses não é como ela é hoje. Um helênico não adora os deuses no mesmo sentido que a cultura judaico-cristã o faz, ou seja, com subserviência. Os Deuses não estão "acima" de nós, estão perto de nós, vivendo lado a lado, como amigos, parentes, ancestrais, companheiros de batalha, companheiros de festas, para o melhor e para o pior. Um helênico não coloca a si mesmo à mercê dos Deuses. Ele encara os Deuses com honra, sendo digno da atenção e favores dos Deuses, como um filho diante de pais que se orgulham dele. Isso sempre foi assim e sempre vai ser. Quando um helênico conversa com os Deuses, ele o faz voltado para o leste ou para o mar, e não prostado em submissão.
(Retirado da página do Helenos, os trechos em itálico são inserções ou edições que julguei adequadas introduzir)

Quando há mais de dez anos eu comecei a me aproximar e reconhecer a minha prática helênica como mais apropriadamente reconstrucionista, esse foi um dos primeiros textos que li. A lista bastante simples parecida fazer muito sentido pra mim, e por vezes, em momentos onde o fluxo de informações e experiências se faz tão intenso que é preciso averiguar os limites e potenciais das experiências pessoas e das interpretações que atribuímos a elas, sempre retorno a ele. Não se trata, mais uma vez, de produzir caixas para separar; as religiões tendem a aproximar-se e o reconstrucionismo não é de modo algum uma tentativa de congelar esse processo. Todavia, como qualquer outra religião ou abordagem sobre a religião, ele também tem suas especificidades e essas devem ser levadas em consideração.

Minha intenção em um arremete final é dizer que, ainda que possamos falar em uma Wicca que se foque numa abordagem helênica, ela não é reconstrucionista. Reconstrucionista não é sinônimo pra quem estuda a religião, mas para quem vivencia a religião dos deuses da Grécia de uma maneira específica, que nesse caso se distingue de outras. A distinção não implica um juízo de valor em termos de melhor ou pior, é tão somente uma diferença - que bom! 

Eirene Theoi! 

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Censo Helênico Brasileiro - 2015


Pessoal,
o grupo Reconstrucionismo Helênico no Brasil (RHB) está iniciando um projeto para conhecer melhor as pessoas que fazem parte ou têm interesse na religião helênica. O Projeto tem como propósito coletar dados para uma melhor compreensão do quadro geral de pessoas que têm interesse ou praticam o Helenismo no Brasil. Nesse sentido, ele é semelhante a outras iniciativas, como o Censo Druídico (para o caso dos grupos celtas) e busca elaborar instrumentos e aperfeiçoar os espaços já estabelecidos para troca de informações experiências e opiniões no que se refere à civilização helênica e, especialmente, à religião.

As questões apresentadas giram em torno de informações sobre (A) a realidade socioeconômica, geográfica e cultural dos laboradores, e (B) sobre sua relação com o Helenismo e a religiosidade ou espiritualidade propriamente ditas. As informações oferecidas são de caráter confidencial. Para acessar o formulário e colaborar com suas informações clique AQUI.